No final de 2016, dois professores da Universidade Harvard, com linhas de pesquisa em educação médica, publicaram um artigo de perspectiva no prestigioso The New England Journal of Medicine, com o intuito de discutir a importância de conviver, dentro da carreira médica, com o conceito de “tolerância da incerteza”, como sendo a nova revolução na medicina.
Naquele momento, não vivíamos ainda sob a égide da inteligência artificial, muito embora a obsessão pelos protocolos, exames e checklists, bem como o acesso instantâneo a uma infinidade de serviços e produtos, já fomentavam um modelo focado na eficiência e na previsibilidade.
Fato é que a diligência em “perseguir a resposta certa, incorre, quase sempre, no risco de simplificar a natureza iterativa e evolutiva do raciocínio clínico, caminhando a passos largos na contramão do cuidado humanístico e individualizado, centrado no paciente”.
Parece claro que a tecnologia realizará as tarefas rotineiras da medicina, sobretudo as quais os algoritmos podem ser desenvolvidos. Na esfera das áreas cirúrgicas, o advento da robótica e dos sistemas de navegação promete cumprir a promessa de atingir precisão máxima e risco mínimo de complicações, em um universo de convicções e demandas na velocidade da luz.
O papel do médico, daqui em diante, será de fortalecer os laços de relacionamento com os pacientes, alinhando expectativas, concentrando esforços no raciocínio clínico e demonstrando tolerância para a incerteza.
Mais do que nunca, os pilares da assistência, da educação e da pesquisa, serão fundamentais para compreender a complexidade do cuidado do indivíduo, valorizando os meios e não os fins, e compreendendo as idiossincrasias que nos tornam autênticos.
Adaptado de: Simpkin, A. L., & Schwartzstein, R. M. (2016). Tolerating Uncertainty — The Next Medical Revolution? New England Journal of Medicine, 375(18), 1713–1715. doi:10.1056/nejmp1606402.